Veja os procedimentos envolvidos na doação de óvulos e sêmen

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63628Técnicas modernas de congelamento de óvulos e espermatozoides permitem que mulheres e homens preservem a própria fecundidade

Diversos estudos apontam que entre 15% e 30% dos casais brasileiros precisam de algum tipo de tratamento médico para conseguir reproduzir. Cerca de um terço desses casais que sofrem de alguma condição que os impede de ter filhos naturalmente acabam tendo de recorrer às técnicas de reprodução assistida, segundo o médico João Ricardo Auler, integrante da Rede Latino-Americana de Reprodução Assistida.

Seja com o uso da inseminação artificial – quando os espermatozoides são inseridos no aparelho reprodutor feminino – ou da fertilização in vitro – quando o óvulo é retirado da mulher e sua fecundação é feita externamente –, é crescente o número de pessoas no Brasil que recorrem às clínicas especializadas. Estima-se que, por ano, 90 mil casais procurem ajuda. Mas as clínicas e hospitais com capacidade para realizar procedimentos desse tipo têm capacidade para atender a 20 mil casos por ano, aproximadamente.

Do ponto de vista técnico, os pacientes brasileiros têm acesso às práticas mais avançadas de reprodução assistida, de acordo com o médico Joji Ueno, do Instituto de Ensino e Pesquisa em Medicina Reprodutiva de São Paulo. A especialidade é bastante desenvolvida no Brasil, que conta com uma rede de clínicas particulares de nível mundial. O tratamento, porém, é caro para os padrões de renda brasileiros (embora seu custo tenha caído nos últimos anos) e a oferta de vagas na rede pública é considerada insuficiente para o tamanho da demanda.

A fila para o tratamento na rede pública pode chegar a dez anos, tempo que pode inviabilizar a gravidez para uma mulher de idade mais avançada. O hospital Pérola Byigton, em São Paulo, considerado referência para a saúde da mulher, é um dos poucos do País que oferece tratamento gratuito para os interessados.

O Brasil, ao contrário dos países desenvolvidos, não possui uma legislação específica para a realização da reprodução assistida. Os especialistas consideram fundamental que o País tenha sua própria legislação para o tema, pois ele envolve questões legais, éticas, familiares e até religiosas. Vários projetos de lei estão em tramitação no Congresso Nacional.

Na ausência de leis específicas, o que rege a conduta dos especialistas no Brasil é uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM) de 2010. O texto determina, por exemplo, o número máximo de embriões que podem ser transferidos para a receptora (dois para mulheres com até 35 anos; três para o intervalo entre 36 e 39 anos; e quatro para as mulheres de 40 anos ou mais). O objetivo dessa medida é limitar o número de gêmeos múltiplos que podem nascer após o procedimento.

O texto do CFM veta a exploração comercial da doação de sêmen ou de óvulos – prática comum nos Estados Unidos, por exemplo. Outra regra importante estabelecida pela resolução é aquela que impede que os receptores conheçam os doadores – e vice-versa. Espera-se que, com isso, sejam evitados casos de contestação de maternidade ou paternidade.

A doação temporária do útero (prática conhecida popularmente como barriga de aluguel) também ganhou regras: a doadora do útero deve ser parenta de até segundo grau da mulher que deseja ter filhos e que tem algum problema médico que a impeça de engravidar. Nesse caso, também não pode haver exploração comercial da prática.

Óvulos

Um avanço tecnológico recente revolucionou a prática de doação de óvulos. Até alguns anos atrás, a medicina não havia conseguido fazer com que os óvulos captados do corpo da mulher sobrevivessem após seu congelamento. Criada há cerca de cinco anos, uma nova técnica de congelamento permitiu que eles passassem a ser guardados da mesma maneira que os espermatozoides, por muitos anos.

Com isso, as mulheres ganharam a chance de fazer a captação de seus óvulos em uma idade considerada ótima para a reprodução (em geral, antes dos 30 anos) e fecundá-los no momento que lhes convier. Estudos médicos mostram que a idade da mulher no momento em que ela teve o óvulo extraído é determinante para o sucesso da fecundação, mesmo que ele seja implantado em uma pessoa na faixa considerada de risco para a gravidez (após os 40 anos).

O congelamento de óvulos também favorece as mulheres que enfrentam algum tipo de enfermidade grave que possa afetar sua fecundidade – o tratamento de câncer, por exemplo, costuma ser agressivo com os ovários. Os óvulos podem ser extraídos quando detectada a doença e utilizados no futuro, seja no próprio corpo ou com o auxílio de uma doadora de útero.

Apesar da facilidade na preservação dos óvulos, o processo para sua extração envolve a realização de um tratamento médico de longa duração e com procedimentos invasivos. A doação de óvulos, portanto, segue um ritmo diferente da doação de sêmen.

O mais comum é que as doadoras de óvulos realizem o ato quando elas próprias encontram alguma dificuldade para engravidar e não têm condição financeira para custear o tratamento. Várias clínicas particulares realizam o tratamento necessário nas doadoras para obter óvulos saudáveis para suas clientes – uma relação de troca que é benéfica para todos e é autorizada pelo CFM.

As principais razões conhecidas para a infertilidade feminina são a clamídia (uma doença sexualmente transmissível provocada por uma bactéria), a endometriose (uma condição que afeta o útero) e problemas ovulatórios (como o ovário policístico ou a idade avançada).

Sêmen

A literatura médica mostra que 40% dos casos de infertilidade de casais têm origem na mulher, 40% no homem e 20% são de causa desconhecida. Não é nada desprezível, portanto, o número de homens que precisam de auxílio para realizar o sonho da paternidade.

Os casais que passam por essa situação podem recorrer aos bancos de sêmen para realizar a concepção. Como a doação é fácil e indolor (a coleta é feita com masturbação) e os espermatozoides mantêm suas características originais por até 50 anos após o seu congelamento, a prática da doação é bastante comum no Brasil e no mundo.

Qualquer pessoa saudável do sexo masculino pode procurar um banco de sêmen para fazer a doação – que deve ocorrer de maneira gratuita, segundo a resolução do CFM sobre reprodução assistida. As características físicas do doador são registradas para que os casais interessados na utilização do sêmen recebam uma carga genética semelhante à sua própria.

O congelamento do sêmen pode ser realizado também para sua utilização futura pelo próprio doador. Pessoas que sofrem, por exemplo, de câncer de testículo ou de próstata podem optar pelo congelamento para preservar a capacidade de reprodução mesmo que o tratamento da doença afete a produção de espermatozoides.

Além das condições que afetam diretamente o testículo ou a próstata, doenças como a varicocele e a caxumba e a exposição constante a determinados componentes químicos (como pesticidas, herbicidas ou chumbo) são as principais causas da infertilidade masculina. Os bancos de sêmen costumam ser ligados às clínicas de reprodução assistida ou a hospitais de referência na especialidade.