‘Ele é minhas pernas e eu sou seus olhos’, diz idosa casada há 41 anos.

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Araraquarenses aprenderam a apoiar um ao outro e a manter a alegria.
“Ela é a tampa do meu caldeirão, sempre foi minha namorada”, define idoso.

Maria do Carmo Soares da Silva, de 66 anos, e Aracy Soares da Silva, de 77, são protagonistas de uma verdadeira história de cumplicidade e amor. Há 41 anos juntos, os moradores de Araraquara (SP) aprenderam a lidar com dificuldades de locomoção e a perda de visão e contam tudo que superaram de forma leve e animada.  “Ele é minhas pernas e eu sou seus olhos”, definiu a aposentada.

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Formado em administração e economia, Silva escuta notícias o dia todo pelo rádio e enquanto se atualiza estende a roupa, coloca a mesa para as refeições e ajuda Maria na locomoção.

“Esperamos que as coisas continuem assim, cada vez mais um ajudando o outro”, disseram.

“Ela é a tampa do meu caldeirão, sempre foi minha namorada. Para viver 41 anos juntos, tem que amar mesmo. Não poderia ser outra pessoa, nossa história foi escrita por Deus”, disse o marido.

“Ele é mais mandão, exigente, eu quero ajudar, já que ele não enxerga”, criticou Maria, para logo emendar uma declaração. “Ele é tudo para mim, meu companheiro, marido, me escuta, me segura. Tudo que eu faço na minha vida é pensando em agradar ele, meu eterno namorado”.

Namoro e casamento
Os dois se conheceram em 1972 na Choperia Barril, que ficava na Rua 3 e era conhecida como ponto de encontro dos jovens.

“Eu ia lá e nós flertávamos, mas nunca conversamos. Ele começou a tentar sair comigo e eu falava ‘não’, até que um dia ele ficou esperando eu sair do meu trabalho em uma farmácia e acabamos combinando o primeiro encontro no outro fim de semana”, lembrou Maria.

Após dois anos e meio de namoro, eles decidiram se casar e não demorou para que tivessem o primeiro filho. A criança morreu com cinco dias e Maria ficou desesperada, mas na mesma semana descobriu que existia um bebê abandonado na Santa Casa da cidade e decidiu adotá-lo. “Fiquei sabendo que a mãe tinha deixado ele no hospital e resolvi cuidar”.

O casal tomou as providências legais e registrou o menino. Em seguida, eles tiveram uma filha e o tempo proporcionou a chegada dos netos, fonte de alegria para a dupla.

Batalhas

Maria nasceu com paralisia cerebral e após poucos anos de casamento passou por cirurgias por conta de uma hérnia no intestino. Quando estava se recuperando, caiu e trincou o joelho. “Nunca mais andei do mesmo jeito, preciso de bengala ou andador. Tive pânico depois disso, tinha medo de cair novamente, fiquei na cama e acabei travando cada vez mais”.

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O marido sofre de retinose pigmentar e com o tempo perdeu a visão. O casal procurou a ajuda de médicos de Araraquara, Campinas e Ribeirão Preto e, em 1998, foi para Cuba com a ajuda do governo em busca de tratamento.

Aracy foi operado durante o período na ilha e, em 2000, os dois retornaram para Cuba para outro procedimento, mas os resultados não foram os esperados. “Parece que eu piorei depois que voltei de lá, eu vejo tudo nublado, com vultos”, contou o aposentado.

Por conta das cirurgias, ele tinha de tomar remédios que “afinavam” o sangue e, quando interrompeu a medicação, sofreu um infarto. “Foi muito triste ver ele daquele jeito. Ele fez cateterismo, angioplastia e depois, em 2006, operou novamente, no total foram cinco cirurgias no coração”, disse a esposa. “Eu lembro que falava: ‘Você está na mão de Deus e ele vai te curar, você vai ficar bem’”.

Atualmente, ele precisa tomar 13 remédios, o ‘kit salva-vidas’, como diz o casal. “Temos dois potinhos: o quadrado lotado de remédios é dele e o redondo é meu. Depois das refeições, essa é a nossa sobremesa”, brincou Maria.

Autor: Da redação com G1 São Carlos Araraquara/Foto: Carol Malandrino/G1